Hoje fui conferir o ensaio do Madrigal dos anos 60. Turma quase completa . Sexagenários retornando ao ponto de mutação. Aferição dos sentimentos.
Enquanto se posicionavam , confortavelmente , pairei meu olhar em cada rosto. E a história de vida de cada um , aflorava pouco a pouco. Entalada , não segurei as lágrimas. Estive naquele grupo , estive naquela praça , estive naquelas vidas que se dispersaram.
Não senti o distanciamento... Nem dos anos, nem dos sentimentos.
Outra vez, cantávamos juntos, ao compasso da mesma melodia... Matematicamente, em uníssono.
A fragilidade humana estava ali registrada. Fragilidade no sentido da emoção e do querer bem.
Amei nossa pele cansada e iluminada de felicidade
Amei os fios prateados , ameninados.
Imaginei a estrada com todas as ramificações...As paralelas , e o encontro na infinitude da alegria.
Descontrolei o choro com Pedro Antonio (Pelé), cantando Uirapuru , do Nilo cantando Ave Maria Brasileira; do Peixoto cantando Rítmo da Chuva e Lagoa do Abaeté, do Luizinho e Rosineide em duo, cantando "Pobre Menina ".
Rosineide ...Voz afinada de menina dengosa ... Ainda !Carlindo em solo , interpretando Andança ... E o coro reafinando-se num contrito momento, de perfeita diapasão.
Sim , o tempo passou ... O presente resgatou presenças, e a expressão foi o canto - Linguagem sonora dos abraços.
Hugo no teclado. Divani e Bernadete maestrando ...
Felisberto , Marlúcia, Regina, Ana Maria, As três irmãs Prado, Marilac , , Zé Ricardo , Nacélio...E ainda, os que chegarão, e todos os que faltarão.
Sou memoralista dos afetos. Provoco a reunião, porque a desejo. Brigo pela união , e ainda cultivo a magia do meu próprio encanto pelos outros e pelo tempo.
Escrevo, porque nada tenho para contar ao analista. Por que curar-me de tanta vida ?
Escrevo porque existem pessoas que instigam as minhas lembranças , nutrem a minha lua, inspiram-me a crença de um poema.
Música , papo, candura, arte... É objeto de crítica. Senti-la como se quer é ato livre.
Jamais serei crítica literária. Não tenho a base acadêmica, nem a quero ...Ela teria destruido a minha ingenuidade poética.
E eu não saberia brincar com as minhas bonecas ... Teria esquecido meus amores, teria desaprendido o exercício da paixão.Não quero o grupo que não namorou em praça pública com as mãos molhadas de pudor, e os olhos faiscando estrelas.
Quero o baião-de-dois de todos os dias. A paçoca no prato, a cajuína S.Geraldo , e queijo de coalho com doce de banana.
O cotidiano nesses últimos dias achou de voltar a ter 20 anos.
Com a beleza das rugas e a iluminação do sorriso .
Salve a poesia, o entusiasmo da alma !
Que fale o coração , que morra de emoção o povo do meu tempo, por mais uma metade do século, que hoje começa do zero.
* O Madrigal Intercolegial do Mons. Montenegro e de Dona Bernadete Cabral faz parte da História do Crato .